Publicado em: 9 dez 2018

Vestidas para mandar: mulheres fazem história na política da Paraíba

As eleições de 2018 marcaram um novo momento para a Paraíba. Vice-governadora, senadora, deputadas estadual e federal: pela primeira vez, mulheres foram eleitas para todos os poderes em disputa. Vestidas de força e determinação, elas demonstraram em números que não estão mais atrás de um grande homem, mas começam a ocupar frente a frente os mesmos espaços de poder que eles.

Com mais de 831 mil votos, Daniella Ribeiro (Progressistas) foi a primeira mulher eleita pela Paraíba para ocupar uma vaga no Senado Federal. Saiu de um quarto lugar, nas primeiras pesquisas de intenção de votos, para o segundo lugar no resultado final, diferença de pouco mais de 13 mil votos do primeiro colocado. A senadora eleita lembra que, assim que colocou o nome na disputa, foi questionada sobre sua capacidade de chegar a este resultado, só mais um dos exemplos onde a condição de gênero foi colocada em foco na sua trajetória política.

“Quando coloquei meu nome na disputa ao Senado Federal, durante muito tempo fui perguntada o que meu pai e o meu irmão achavam de estar na disputa. A decisão foi unicamente minha, mas recebia estas perguntas, que não é o tipo de pergunta geralmente feita aos homens. Como se eu só estivesse ali por ter a anuência dos homens da minha família”, disse.

“É IMPORTANTE DIZER QUE AINDA HOJE VAMOS PRECISAR MOSTRAR QUE ESTAMOS ALI PORQUE SÃO ESPAÇOS NECESSÁRIOS E QUE A GENTE TEM QUE LUTAR MUITO PARA SE CHEGAR NESTES ESPAÇOS”. DANIELLA RIBEIRO, SENADORA ELEITA.

Vereadora pela cidade de Campina Grande e deputada estadual por dois mandatos, Daniella Ribeiro muitas vezes virou pauta nos meios de comunicação pelo uso de determinada roupa ou mudança de corte de cabelo, posicionamentos que resultam dos preconceitos históricos que há na estrutura da sociedade, avalia a senadora eleita.

“São resquícios do machismo e de uma sociedade e mídia, sobretudo a americana, que infelizmente encaram as mulheres como um objeto, alguém que vem a ocupar um espaço apenas pela sua aparência. Não só os homens, mas também mulheres que criticam e observam o que é exterior. Você corta um cabelo e depois que sobe numa tribuna, faz um discurso sobre um tema relevante, o que vão te perguntar é por que você mudou o cabelo. Muitas vezes vemos colegas homens, que chegam com roupa extravagante, e não veremos ninguém falar disso”, disse.

Daniella percebe mudanças na forma de enxergar as mulheres, mas sabe que, num espaço construído e constituído em maior parte por homens, continuará sendo necessário fincar a voz para ter a fala garantida. “Tivemos um certo avanço em relação aos espaços conquistados, mas acredito que em alguns momentos precisarei ser mais forte, no sentido de me colocar de uma forma que necessite. No sentido figurativo, se você não sentar no lugar que te cabe, você vai ficar esperando, esperando e muito provavelmente, pela maioria ser masculina, você vai ‘ficar em pé’”, disse.

PELA 1º VEZ MULHER ENCABEÇA VOTAÇÕES PARA ALPB

A ex-secretária de Estado e professora Cida Ramos (PSB) foi a primeira mulher a encabeçar o ranking de votos na disputa pelo legislativo estadual. Nunca uma candidata havia sido campeã de votos na disputa por uma cadeira na Assembleia Legislativa da Paraíba (ALPB). No total, 56.048 paraibanos confiaram seu nome àquela Casa, volume que numericamente só perde para Toinho do Sopão, que em 2010 teve 57.592 votos.

Para Cida, conquistar espaços é uma luta diária, que ainda caminha a passos lentos. “Há uma cobrança maior sobre as mulheres. Na estética, no lado afetivo e ainda há a cobrança de se mostrar competente. A gente precisa provar o tempo inteiro que a gente faz e faz bem. Acredito que ainda há um descompasso muito grande entre nossa presença na sociedade e nossa presença no parlamento, mesmo estando em todos os setores da vida econômica. Na Paraíba mesmo, de 36 deputados, só cinco são mulheres. Temos países no Oriente que têm mais representação que no Brasil”, disse.

“NÓS QUEREMOS ESTAR NA MEDICINA, PILOTAR AVIÕES, DIRIGIR CAMINHÕES, MAS QUEREMOS TAMBÉM ELABORAR AS LEIS, DIZER COMO ESSE BRASIL, DO PONTO DE VISTA INSTITUCIONAL, DEVE SER CONDUZIDO”. CIDA RAMOS, DEPUTADA ESTADUAL ELEITA.

Cida entrou na política aos 15 anos, no movimento estudantil. Foi presidente do Centro Acadêmico de Serviço Social (CA) e também do Diretório Central dos Estudantes (DCE). Foi a única mulher a presidir por três mandatos a Associação dos Docentes da Universidade Federal da Paraíba (ADUFPB), além de ter sido secretária de Estado do Desenvolvimento Humano. Cida foi a primeira mulher com deficiência a concorrer à Prefeitura de João Pessoa, em 2014. Apesar da trajetória, a deputada eleita destaca que costuma sofrer cobranças que não são comuns aos homens.

“Sempre dizem comigo que sou muito dura, mas, para me constituir, o que me faltava na perna eu reforcei na voz. Minha voz é uma voz impositiva, que não vejo como defeito, mas como qualidade. Sou determinada, trabalho muito e cobro isso de quem convive comigo. Essa firmeza muitas vezes incomoda, mas o engraçado é que nunca vi nenhum homem ou nenhum outro secretário ser cobrado por isso. Mas das mulheres se cobra”, disse.

A professora destacou que fará do seu mandato um instrumento para diminuir as diferenças sociais. “A política foi o canal de expressão que encontrei para lutar contra o preconceito. Meu mandato vai ser um espaço fundamental para a luta das mulheres, por emprego e renda, reconhecimento, respeito, contra violência. Essa luta é uma luta por uma sociedade desenvolvida, justa, igualitária e democrática. Não vai existir democracia numa sociedade onde a mulher tenha presença diminuta. Quero fazer um mandato para todos os segmentos que na sociedade ainda precise arrombar portas para conquistar direitos e se colocar como cidadão”, disse Cida.

MULHER VOLTA A OCUPAR CÂMARA FEDERAL

Desde 2002, somente três mulheres foram eleitas pela Paraíba para a Câmara Federal. Uma delas, a delegada e ex-prefeita de Monteiro, Edna Henrique (PSDB), que no último pleito recebeu 69.935 votos. A deputada federal eleita acredita que as mulheres estão conquistando mais espaços na vida pública, ainda que num ritmo lento.

“Para mim foi uma grande satisfação. Estou muito feliz em ser a terceira mulher da Paraíba eleita para a Câmara Federal. A primeira eleita pela região do Cariri. Não resta dúvida que ainda se tem muito preconceito, é um processo lento, mas nesta última eleição tivemos um avanço quando comparamos com a última disputa”, disse Edna Henrique.

“VEJO QUE AINDA PRECISAMOS DAR UMA CAMINHADA GRANDE PARA QUE A GENTE POSSA TER MULHER A FRENTE DO PODER PÚBLICO”. EDNA HENRIQUE, DEPUTADA FEDERAL ELEITA.

A deputada eleita defende que as mulheres busquem conquistar os espaços, mesmo quando negados. “As mulheres não devem absorver esses preconceitos. Eu pelo menos não absorvo e não enxergo comigo. Meu marido mesmo, o deputado João Henrique (PSDB), sempre incentivou que eu estivesse na política. Acredito que as mulheres precisam dessa ajuda, dessa motivação para que a gente possa entrar na política. Nós não somos só agentes políticos, mas somos também donas de casa, mães, esposas, temos essa desvantagem, os homens só se direcionam para a política, para sua empresa, nós, mulheres, temos muitas cobranças, mas não podemos nos acomodar”.

Em 2014, a Paraíba elegeu três mulheres para a Assembleia Legislativa da Paraíba (ALPB): Daniella Ribeiro (PP), com 46.938 votos; Estela Bezerra (PSB), com 34.929 votos; e Camila Toscano (PSDB), com 32.682 votos. Nenhuma mulher foi eleita para Câmara Federal. Em 2018, cinco mulheres foram eleitas deputadas estaduais: Cida Ramos, Estela Bezerra, Camila Toscano, Pollyana Dutra e Dra Paula, além de Edna Henrique para Câmara Federal.

 

 

Correio da Paraiba




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