Publicado em: 2 dez 2015

Eduardo Cunha atuou para beneficiar bancos liquidados

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), fala com a imprensa nesta segunda-feira (30)

No período em que o banqueiro André Esteves, ex-presidente do BTG Pactual, negociava a compra da massa falida do Banco Nacional, extinto em 1995, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), trabalhou de forma persistente para viabilizar uma operação financeira que favoreceria os bancos liquidados e socorridos pelo governo.

Se as propostas do deputado tivessem sido sancionadas pela presidente Dilma Rousseff, provocariam um rombo próximo de 40 bilhões de reais aos cofres públicos, segundo fontes do Banco Central. Na prática, o teor das emendas do deputado faria com que o Nacional – que já foi um dos maiores bancos do país, com 1,2 milhão de clientes, controlado pela família Magalhães Pinto – passasse da situação de devedor confesso à de credor da União. Passados vinte anos do Programa de Estímulos à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), o Nacional ainda deve, em 2015, 17,6 bilhões de reais ao governo.

O BTG Pactual tinha interesse em comprar o Nacional porque via chances de ganhar dinheiro de duas formas. Esteves considerava ser possível, com o aval do Congresso, transformar pouco mais da metade dos 31 bilhões de reais de crédito em “títulos podres” do banco em dinheiro. Assim, conseguiria pagar o que o Nacional devia à União e ficar com o restante. Além disso, o banco liquidado tinha mais de 10 bilhões de reais em créditos fiscais. Esteves tinha “expertise” em bancos liquidados. Antes, tinha comprado o Bamerindus, que também foi socorrido pelo Proer, por 418 milhões de reais. Em troca, levou 2 bilhões de reais em créditos tributários.

MP 627 – O banco BTG Pactual chegou a orientar o deputado Eduardo Cunha a modificar trechos de outra medida provisória, a 627, que regulava a tributação de empresas no exterior. O deputado era relator do texto, que virou lei em 2014. Reportagem do jornal O Globo teve acesso à troca de e-mails entre o deputado e representantes do banco. Nelas, diretores do BTG dão indicações assertivas de alterações na medida. Um exemplo: “Art. 24, I: substituir dependência por controle, para diminuir amplitude”, escreve a Cunha um diretor do BTG. O projeto original, do Planalto, recebeu 513 emendas, das quais 76 foram aprovadas. Ao menos uma delas agradou o setor bancário: o artigo 109 eliminou a utilização de créditos tributários com o governo por bancos em liquidação. Em nota, o deputado confirmou a troca de e-mails com a direção do BTG Pactual, mas explicou que, na condição de relator da MP, conversou “amplamente com várias associações e instituições do setor”.

Investigação – O Ministério Público abriu investigação contra Cunha a partir de um documento encontrado na casa do chefe de gabinete do senador Delcídio Amaral (PT), Diogo Ferreira, que foi preso na semana passada juntamente com Esteves. No verso desse documento, estava escrito que, em troca de uma emenda à medida provisória 608, o BTG, que estava interessado em utilizar os créditos fiscais da massa do Bamerindus, pagou 45 milhões de reais ao presidente da Câmara.

Cunha apresentou uma emenda a essa MP, de 2013, que propunha retirar do texto artigo que permitia aos bancos liquidados transformar créditos tributários em crédito presumido a partir da data da liquidação extrajudicial. A emenda de Cunha não foi aprovada. Ele disse na segunda-feira que, nesse caso, a proposta não tinha objetivo de beneficiar o BTG ou qualquer outro banco. Negou também a hipótese de que apresentou a emenda justamente para criar uma dificuldade ao BTG e assim ter oportunidade de negociar a retirada do texto. O BTG negou na segunda que a instituição tenha feito pagamento para suposto benefício na MP. Em nota, a instituição afirmou que o banco e a massa falida do Bamerindus não se beneficiaram da aprovação da emenda apresentada pelo Cunha nem do texto final da Lei. Procurado nesta terça-feira, o banco afirmou, em nota, que não tem relação com o Nacional e, por isso, não haveria o que comentar sobre a atuação do parlamentar.

O histórico da atuação parlamentar revela que Cunha sempre fez proposições para beneficiar os bancos liquidados. Por três vezes, tentou incluir a permissão para que os bancos falidos usassem títulos – os chamados Fundos de Compensação de Variações Salariais (FCVS) – para quitar as dívidas que tinham com a União. No entanto, a presidente Dilma Rousseff, seguindo orientação da área técnica do governo, impediu que as instituições liquidadas usassem esses papéis, sem liquidez e de securitização incerta, para acertar as contas.

Cunha chegou a procurar o advogado-geral da União, o ministro Luís Inácio Adams, com a proposta de que o governo reconhecesse os FCVS como instrumentos da dívida pública federal. No entanto, Adams consultou o procurador-geral do Banco Central, Issac Sidney Menezes. Para o técnico do BC, o teor do pedido contrariava o interesse público porque ampliava os benefícios que já tinham sido concedidos aos bancos liquidados e prejudicavam financeiramente a União. Sem sucesso nessa empreitada, o deputado até conseguiu, com outras emendas, que os bancos liquidados usassem créditos tributários para pagar impostos relativos a ganhos de capital, o que favoreceria o Bamerindus. Mas a presidente também vetou esse favorecimento.

 

 

 

 

 

 

Com Estadão Conteúdo



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